O rompimento da barragem em Mariana causou um impacto de grande magnitude
no rio Doce, com graves implicações sociais e ambientais. Mais de 600 km de
habitats fluviais foram destruídos pela torrente de lama, soterrando e
asfixiando a vida aquática. O rio Doce esta virtualmente morto. É provável que peixes
e outros organismos continuem morrendo ao adentrar o rio principal vindo dos
afluentes.
E sua capacidade de diluir esgotos, serviço que prestava gratuitamente a
sociedade, diminuiu de forma drástica.
O desastre acentua um longo processo de degradação da bacia do rio Doce.
No inicio dos anos de 1990 conheci o rio Piracicaba, um dos principais
afluentes do rio Doce. Estava destruido pelo garimpo. O Plano da Bacia mostra
cabalmente a péssima saúde ambiental da bacia, devastada tal qual a do rio
Paraiba do Sul.
O dano esta feito. É hora de buscar soluções e tecnologias para repará-los.
No Brasil, a engenharia, a geologia e a biologia brasileiras são bastante
avançadas na recuperação de áreas degradadas terrestres. Não há qualquer dúvida.
Mas quando se trata de recuperar rios estamos entre os paises mais atrasados do planeta. Basta ver nossa arcaica engenharia de drenagem urbana, que continua emparedando os rios em caixas de concreto, isolando-as da paisagem e aniquilando qualquer possibilidade de recuperação futura.
A renaturalização dos rios, prática corriqueira na Europa, Austrália e América do Norte, ainda engatinha no Brasil, de modo que não temos engenheiros, arquitetos paisagistas, biólogos ou geólogos com conhecimento para planejar a recuperação de um rio. Precisamos fazer parceria com outros países para não gastar tempo e dinheiro inventando a roda.
Uma das organizações mais capacitadas para ajudar no planejamento e
supervisão das atividades de recuperação de rios de grande porte como o rio
Doce, quiça a única, é o Corpo de Engenheiros do Exército dos EUA (US Army
Corps of Engineers), com vasta experiência prática, que conta com 37 mil
funcionários civis e militares.
O Exército Brasileiro, através da unidade que comanda os Batalhões de
Engenharia de Construção (BECs), poderia firmar convênio com Corpo de Engenheiros
do Exército dos EUA para assessoria técnica e transferência de tecnologia para
recuperar o rio Doce, incorporando no processo o IBAMA, a CPRM, a Eletrobrás, a
UFMG e a UFES. Outras instituições lideres no tema que poderiam ser convidadas são
o Centro Europeu de Recuperação de Rios da Comunidade Européia, o Canadian
River Institute da Universidade de New Brunswick e o Australian River Institute
da Universidade de Griftt (Queensland), pátria da BHP.
É uma oportunidade única de aprender novas tecnologia e treinar dezenas
de especialistas brasileiros na recuperação do rio Doce e afluentes,
reaplicando posteriormente em projetos para revitalizar rios em péssimo estado
ambiental como o Paraiba do Sul, o Tietê, trechos do São Francisco, os afluentes
da baia de Guanabara e centenas de rios urbanos.
É certo que muitas outras atividades devem ser implementadas para
recuperar a bacia.
Cabe lembrar que em Niterói, a UFF e a Prefeitura, com apoio de engenheiros
e cientistas europeus e da Universidade de Maryland, iniciaram um projeto
pioneiro de renaturalizar o rio Jacaré, naquilo que pode ser o embrião de um
futuro Instituto dos Rios Fluminenses. Muito apropiado alías, pois a
universidade carrega o rio em seu nome. Fluminense deriva do latim “Fluminis”,
que significa “rio”.
Quem sabe o evento catastrófico pode ser o ponto de virada no futuro de
nossos rios.